terça-feira, 16 de novembro de 2010

Arnaldo Jabor retoma a boemia do Rio de Janeiro pós-Segunda Guerra em A Suprema Felicidade

A convite da Paramount Pictures fui conferir no Rio de Janeiro o novo filme de Arnaldo Jabor, A Suprema Felicidade. Confira entrevista com Arnaldo e o elenco do filme e o comentário sobre a produção:

Prestes a completar 70 anos Arnaldo Jabor resolveu relembrar a vida do Rio de Janeiro das décadas de 1940 e 1950. Mas ao invés de usar a crônica, que tem sido seu principal meio de expressão nos últimos 20 anos, Jabor retoma a carreira de cineasta – deixada de lado durante todo este tempo, após filmes como Toda Nudez Será Castigada e Eu Sei Que Vou te Amar – e volta para trás das câmeras com A Suprema Felicidade.

A produção não chega a ser autobiográfica – não assumidamente por Jabor – mas retrata histórias e momentos da vida do carioca, ainda que seja recheada de ficção. O intimismo e o tom memorialista permeiam o filme que padece de maiores complexidades.

No dia em que termina a Segunda Guerra Mundial, o Rio de Janeiro festeja nas ruas o fim de uma das épocas mais sangrentas da história. Paulinho (interpretado por Caio Manhente, Jayme Matarazzo e Michel Joelsas em três épocas distintas) começa a trama com oito anos e assiste ao exultante momento de felicidade dos pais: Marcos (Dan Stulbach), um militar aviador da FAB, e Sofia (Mariana Lima), que largou o sonho de ser atriz para se dedicar à família. Mas a alegria dura pouco. Logo se vê a desestrutura familiar, a opressão do homem trabalhador sobre a mulher dona-de-casa, em um retrato histórico da classe média pré-ditadura.

Paulinho cresce assistindo às brigas dos pais, sofrendo com o bullying dos colegas de classe e compartilhando com o amigo Cabeção (César Cardadeiro) os momentos que passa na rua e no colégio jesuíta em que estuda. Apesar de admirar o pai, ele vê no avô boêmio, Noel (um Marco Nanini que rouba a cena em ótima interpretação), o conforto, a segurança e o espaço para os conselhos e conversas diárias – o que rende ótimas cenas e falas, como “Ninguém é feliz, por sorte dá para ser alegre” e “A vida gosta de quem gosta dela”. Noel é um dos personagens mais bem construídos e marcantes do filme.

Começa a aflorar em Paulinho seus desejos mais íntimos – com aquele toque de Jabor ao apelo sexual que ajuda a construir o cenário da época e do lugar. O rapaz se apaixona por Deise (o inexpressivo e nonsense personagem de Maria Flor) e depois cai de amores por Marilyn (Tammy di Calafiori), uma garota de 16 anos que dança em uma casa de prostituição e será o desafio amoroso de sua vida. Paulinho é, enfim, um típico adolescente de classe média: tem crises existenciais, paixões a conquistar, conflitos com o amigo e dramas familiares.

O recurso utilizado para apresentar a história é o ir e vir no tempo – nada muito confuso, mas que deixa lacunas na trama e faz com que o foco nos personagens por vezes se perca. Alguns atores e a própria mise-en-scène do filme são duras, estáticas, com fortes marcações teatrais que empobrecem o ritmo fílmico.

O longa, na verdade, não tem um único personagem principal. Apesar da história girar em torno de Paulinho, outros ganham grande destaque. A tentativa de Jabor de fazer um filme de múltiplos gêneros (uma mistura de drama, comédia, romance e até musical) é interessante, mas acaba não sendo bem executada – os musicais, por exemplo, ora funcionam, ora não se enquadram com o tom narrativo do filme.

O retrato de um Rio de Janeiro sem trânsito, em grande euforia, fica marcado pela vontade de Jabor em resgatar um período da história, e, ao mesmo tempo, contar a sua própria, de forma poética e saudosista.

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