segunda-feira, 9 de junho de 2008

Como o seriado Sex and the City inventou a mulher moderna

Fonte: Revista Época - 09/06/08
Por que uma geração inteira se identifica com as personagens da série de TV e do filme que está batendo recordes de bilheteria

Martha Mendonça e Marianne Piemonte

ÍCONE Carrie (Parker) desvia pescoços femininos em uma cena de Sex and the City. As protagonistas da série viraram referência

Quatro mulheres tagarelas, instáveis, complicadas, consumistas destronaram um dos maiores heróis da história do cinema. Desde que estreou nos Estados Unidos, há pouco mais de uma semana, Sex and the City, o longa-metragem inspirado na série de TV de mesmo nome, multiplica sua bilheteria, ofuscando até Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, a aguardada volta às telas do personagem encarnado por Harrison Ford. A distribuidora Warner previa arrecadar US$ 35 milhões com Sex and the City no primeiro fim de semana nos cinemas americanos. Foram US$ 55 milhões – que geraram o inevitável tititi sobre um novo filme. Na televisão, mesmo quatro anos depois da última temporada da série, as reprises dos episódios continuam a atrair 2,5 milhões de telespectadores a cada exibição. Em Nova York, as lojas e os restaurantes que servem de cenário para os episódios são temas de passeios turísticos de agências. No Brasil, a estréia de Sex and the City estava programada para a sexta-feira 6 de junho e também se espera uma bilheteria recorde. Por que, uma década depois de criada, Sex and the City ainda é um fenômeno? Provavelmente por ter sido a primeira, e ainda a única, série que mostra como as mulheres são – ou pelo menos como elas se vêem e gostariam de ser. Nunca antes a mulher de mais de 30 anos, cosmopolita e de classe média, fora retratada com tamanha fidelidade em suas conquistas e contradições. Todas as vezes que Carrie, Samantha, Miranda e Charlotte, o quarteto fantástico de Manhattan, sentavam-se num bar e pediam um Cosmopolitan – coquetel à base de vodca e suco de cranberry, uma espécie de amora –, milhares de mulheres no mundo reconheciam a si mesmas ou a alguma amiga, prima ou vizinha. Que mulher desta geração não se viu, em alguma fase da vida, questionadora como Carrie, romântica como Charlotte, sarcástica como Miranda ou caçadora como Samantha? Carrie, Charlotte, Miranda e Samantha viraram ícones num momento em que as mulheres buscavam novas referências, passada a época da dedicação à família e a revolução dos sutiãs queimados. Nem tanto o fogão, nem tanto a selva do mercado. Daí a paixão sem fim por personagens que, ao mesmo tempo, pagam as próprias contas, correm atrás do amor e não sentem culpa por gastar uma fortuna num par de sapatos. “Essa é uma geração de mulheres que querem viver suas próprias fantasias. Solteiras, namorando ou casadas, querem ser donas de suas próprias vidas. Querem amar os homens que escolherem e comprar as roupas que quiserem”, afirma a sexóloga Pepper Schwarz, da Universidade de Washington, em Seattle. “As protagonistas de Sex and the City são ícones de um pós-feminismo que acreditam que os direitos da mulher já estão garantidos e que é hora de ir atrás dos sonhos individuais”, diz Márcia Messa, mestre em Comunicação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Abaixo a elite negra

Fonte: Revista Veja - 09/06/08
A novela A Favorita prefere denunciar a luta de classesa ser politicamente correta com os negros
Marcelo Marthe

Taís e Gonçalves: garota mimada e deputado corrupto

Para o noveleiro João Emanuel Carneiro, Taís Araújo é mais que uma bela atriz – é o seu pé de coelho. Ela teve papéis de destaque nos dois folhetins de sucesso das 7 que ele escreveu. E, desde a semana passada, isso se repete em A Favorita, que alça Carneiro, de 38 anos, ao grupo seleto de autores aos quais a Globo confia as tramas das 8. É de novo por meio de Taís que ele retoma um expediente que já se tornou sua marca: a escalação de atores negros para papéis que fogem às convenções. Em Da Cor do Pecado (2004), transformou-a na primeira protagonista negra de uma novela da emissora. Depois, em Cobras & Lagartos (2006), na megera que vivia às turras com o malandro interpretado por Lázaro Ramos. A Alícia de A Favorita integra uma família negra politicamente incorreta. O patriarca Romildo Rosa (Milton Gonçalves) é um deputado corrupto em busca do terceiro mandato (qualquer eco de Brasília é coincidência). Com sua franja em estilo lambida de vaca, a filha mimada é a pedra em seu sapato. A artista plástica Alícia chama o pai de ladrão e desdenha de seu populismo (Romildo posa de "cavaleiro do povo" por ter passado fome). Ela chantageia o pai para obter dinheiro público para suas exposições, sob a ameaça de divulgar fitas que o envolveriam em obras superfaturadas. O clã se completa com o irmão Diduzinho (Fabrício Boliveira), um bêbado que o deputado quer transformar em político.
Nas novelas de Carneiro, a cor da pele é um detalhe que não impede ninguém de ser rico ou safado. O núcleo negro não está ali em nome da "afirmação racial", e sim como parte de uma certa comédia da luta de classes que atravessa A Favorita. Ela fica mais explícita no embate entre o milionário Gonçalo (Mauro Mendonça), ex-operário esquerdista que virou patrão, e o patético Copola (Tarcísio Meira), líder sindical que não se desapega do discurso da "revolução do proletariado". Gonçalo ironiza o fato de a neta Lara (Mariana Ximenes) ser de esquerda (a moça recita chavões do tipo: "Não compactuo com a exploração do homem pelo homem"). Já Copola ficou com a pulga atrás da orelha ao saber que o neto Cassiano (Thiago Rodrigues), também operário e namorado de Lara, se esbaldaria no aniversário dela, na mansão do desafeto.

Nos primeiros capítulos de A Favorita, Carneiro empreendeu um retorno às raízes do melodrama. Em vez de investir em seqüências de ação e pirotecnia como as que se viam nas últimas novelas das 8, valeu-se de uma narrativa sóbria e um elenco enxuto. Preferiu inovar nos detalhes, a exemplo do núcleo negro. Com efeito: a cena mais marcante do primeiro capítulo foi o strip-tease da personagem de Taís Araújo num comício do pai. A julgar pelos índices do Ibope, o noveleiro vai precisar de outro pé de coelho. A média de estréia de A Favorita, de 35 pontos, foi a pior de que se tem registro nas novelas das 8.

Tudor diet

Fonte: Revista Veja - 09/06/08

Maria Bolena foi amante de Henrique VIII antes de suairmã Ana. Mas A Outra tira o sal dessa história suculenta

Isabela Boscov

Durante os 118 anos da dinastia Tudor, entre 1485 e 1603, a Inglaterra passou de um reino instável, sempre acossado pelos interesses ora da França, ora da Espanha, a uma superpotência: o País de Gales foi incorporado à sua estrutura administrativa, a Irlanda foi pacificada, o inglês se tornou a língua nacional de fato, as artes floresceram, seu poder político se separou em definitivo da Igreja de Roma, o país se abriu às navegações e a riqueza se multiplicou, assim como sua influência esmagadora sobre o cenário global. Sob Henrique VIII e, em especial, sob sua filha, Elizabeth I, a Inglaterra se tornou, em suma, uma nação, e definiu muito do que até hoje constitui sua identidade. No que toca à ficção histórica, porém, esses feitos pouco interessam; para ela, o que distingue os Tudor é a sua capacidade inesgotável para a intriga.– tanto a política quanto a sexual, até porque poucas famílias reais misturaram sexo e poder de forma tão intensa e criativa. Por causa dessa imagem, Henrique VIII e Elizabeth I são disparado os reis preferidos para fins de entretenimento; e por causa dela também os roteiristas se sentem autorizados a perpetrar bobagens como A Outra (The Other Boleyn Girl, Inglaterra/Estados Unidos, 2008), que estréia nesta sexta-feira no país.

A outra, no caso, é Maria Bolena, irmã pouco mais nova da notória Ana Bolena – a cortesã por quem Henrique VIII se divorciou da rainha Catarina de Aragão e rompeu com o papa. Maria passou antes de Ana pela cama do rei e é possível que tenha tido dele um filho, que não ganhou o sobrenome Fitzroy dado aos bastardos reconhecidos pelo rei porque, a essa altura, a campanha para tornar Ana Bolena rainha andava a toda – e até para os padrões de rotatividade de Henrique VIII pegaria mal assumir um filho da irmã de sua noiva. A história mostraria que Maria teve sorte: após alguns anos de casamento, Henrique VIII se cansou de Ana e executou a ela e a seu irmão, George, com uma acusação estapafúrdia de incesto. A caçula só escapou ilesa da perseguição por estar já casada de novo, em obscuridade e sem favor na corte.

Reunindo o pouco que se sabe de Maria ao muito que é conhecido sobre Ana e adicionando à mistura alguma imaginação fundamentada, a escritora Philippa Gregory fez de A Irmã de Ana Bolena um romance repleto de detalhes saborosos sobre os costumes do período e escrito em uma prosa que não ofende. Acima de tudo, o livro (lançado aqui pela Record) contém fartas doses de maquinação – o esporte por excelência das cortes – e de ambição nua. Tudo o que a autora urdiu, o roteirista Peter Morgan, de A Outra, desmancha em sua adaptação. As Bolena juntaram seu destino ao do rei dentro de um quadro épico de disputa pelo poder; no filme, tudo se resume a uma rivalidade entre irmãs. Vá lá, que irmãs: juntas, a loira Scarlett Johansson, como Maria, e a morena Natalie Portman, como Ana, atendem à provável totalidade dos sonhos de consumo do público masculino (Eric Bana, como o ainda atlético e atraente Henrique VIII, faz as honras junto à platéia feminina). Não que Morgan aproveite a contento o potencial desse trio – a série de televisão Os Tudor é muito mais picante –, ou a crueza das intrigas que Philippa desenha em seu livro. Quando escreveu A Rainha, com Helen Mirren no papel de Elizabeth II, Peter Morgan não economizou na ferocidade; para A Outra, ele achou que beleza e suspiros já dariam conta do recado. Os Tudor, porém, foram mais

Um desfile de vaidades

A futilidade e o glamour do mundo fashion chegamàs telas com o filme O diabo veste Prada
Por Luciana Franca

Cenas: a editora Miranda Priestly (Meryl Streep) num modelito exclusivo(à esq.) e sua assistente Andrea (Anne Hathaway) em suas tarefas. Nocentro, passeando com o cachorro da chefe e, à direita, cuidando dos trajes

Roupas estonteantes de alguns milhares de dólares ganhas. Estilistas internacionalmente famosos falando freneticamente ao celular. Uma assistente, claro que não poderia faltar uma competente e ágil assistente, providenciando para a chefe um jatinho no meio da noite e exigindo as provas de impressão da nova aventura de Harry Potter para que suas filhas leiam no avião antes de o livro chegar às livrarias. Tudo isso que cerca a poderosa editora de moda do filme O diabo veste Prada, em cartaz nacional na sexta-feira 22, parece ficção hollywoodiana. Mas é pura realidade – e quem freqüenta o mundo da moda sabe que aquilo que é mostrado nessa deliciosa comédia dramática de David Frankel (baseada no best-seller homônimo de Lauren Weisberg) acontece de verdade. “Gosto da história porque retrata a indústria da moda com verdade. Rola tudo aquilo mesmo”, diz Erika Palomino, editora de moda do site que leva seu nome e da revista Key. Não é para menos. Ao longo de um ano, Lauren foi assistente de Anna Wintour, a temida e rigorosa editora de moda da revista Vogue americana. A experiência serviu como base para descrever no filme a autoritária Miranda Priestly (interpretada com elegância e ironia pela atriz Meryl Streep), editora da fictícia revista Runaway, e sua assistente Andrea Sachs (vivida por Anne Hathaway). Lauren não assume com todas as letras que buscou inspiração na ex-chefe. Mas a consultora de moda Emanuela Carvalho, que trabalhou como estagiária e assistente de moda da New York Magazine, confirma que vaidade e futilidade são como linha e agulha no chamado mundo fashion – ou seja, companheiras inseparáveis. “Nós, que vivemos nesse meio da moda, conhecemos muitas histórias sobre Anna Wintour. O livro certamente foi inspirado nela.”
Entre algumas demonstrações de arrogância, a diretora da Vogue sempre exibiu, por exemplo, a idiossincrasia de trancar vestidos exclusivos e outras peças de uma estação do ano no departamento de arquivo da revista para que nenhuma concorrente pudesse fotografá-los. “Lembro que no meio de uma sessão de fotos faltava um par de botas de pele pink do estilista Manolo Blahnik. Minha diretora, Jade Hobson, pegou o telefone e teve de implorar para Anna liberar o calçado”, diz Emanuela. Deixar as salas de desfiles da concorrida semana de moda em Paris porque as apresentações estavam alguns minutos atrasadas é um comportamento até que aceitável para alguém na posição de Anna Wintour. Mas ela chegava ao extremo de proibir que as pessoas olhassem em sua direção quando dividia com elas o mesmo elevador. Detalhe: a editora de moda de O diabo veste Prada tem o mesmo comportamento.
Os chiliques e as crises de autoritarismo de Meryl Streep, que não se cansa de repetir que na vida real a sua cabeça é ocupada “com coisas mais interessantes e mais úteis que os trajes que estão no guarda-roupa”, divertem o público masculino. Já o corte impecável dos modelos que veste e a classe com que os desfila causam suspiros (e, vá lá, uma ponta de inveja) na platéia feminina. São os fabulosos figurinos usados tanto por ela quanto pela sua assistente que roubam a cena do filme – e mais uma vez, também nisso, o frufru do filme empata com o da vida real. A garota comum se contamina com o novo universo e começa a usar as grifes caras tiradas do guarda-roupa da Runaway. A consultora Emanuela endossa: “O que me salvava na época em que trabalhava em Nova York eram os bazares que as grifes promoviam para a imprensa. Comprei bolsa Fendi e carteira Dolce & Gabbana por US$ 50. Era uma forma de andar chique, já que o salário era pouco.” E, nesse campo, o chique, seja ele o que for, é tudo. “Moda é glamour. E o glamour é o que move e excita esse mundo”, diz ela.

Sua vida no DVD

Fonte: Revista Isto é - 09/06/08
Virou mania presentear os amigos com produções para fazer chorar

Por Celina Côrtes

Imagine ser surpreendido na festa de aniversário com um pequeno documentário que percorra algumas de suas melhores lembranças, ao som de músicas definitivas em sua vida, pontuado por depoimentos das pessoas mais queridas! Esse pacote de fortes emoções está turbinando empresas que colhem os resultados da popularização dos gravadores de DVDs. As produções seguem um padrão televisivo, do tipo “esta é a sua vida”. E viraram o sonho de consumo da garotada aos mais velhos. “De um ano para cá, nossa demanda cresceu muito. Fazíamos dez gravações mensais, hoje fazemos 30”, contabiliza Ricardo Langer, um dos sócios da Vídeo Shack Laboratório, uma ex-locadora de vídeos em Ipanema, na zona sul do Rio.

DEMANDA Langer viu triplicar em um ano o pedido de gravações por mês

O trabalho é até simples. Requer computadores e uma ilha de edição, que pode ser pilotada por uma única pessoa. Solicitações de DVDs desse gênero costumam ser feitas por parentes e amigos. Os mais organizados já chegam com o acervo de imagens escolhido e basta um dia para concluir a produção. Mas há clientes que nem sequer sabem o que querem e ainda dependem do laboratório para produzir depoimentos, o que soma mais dois ou três dias de dedicação. Garimpadas as cenas, os produtores abusam de recursos de animação proporcionados pela tecnologia. Em alguns casos, os DVDs provocam cascatas de lágrimas. “Foi muito emocionante ouvir minha irmã dizer eu te amo, coisa que ela não tem coragem de falar ao vivo”, comenta Fernanda Spyer, que recebeu um belo flash-back de sua trajetória quando fez 18 anos.

Mas nem sempre as empresas têm tanto trabalho. Na carioca Supervídeo Produtora, outra antiga locadora de Ipanema, muita gente traz o serviço quase completo, deixando apenas a edição final sob o cuidado dos especialistas. São pessoas que dominam softwares de vídeos e outros programas de computador para incrementar o DVD. Algumas delas também estão se arriscando no novo segmento. A programadora visual Heloisa Pinheiro, 47 anos, e a arquiteta Márcia Dal Poz, 50, já pensam em profissionalizar a atividade que começou como brincadeira. “É fácil e delicioso fazer”, resume Heloisa. O resultado tem um sabor de eternidade até para o mais comum dos mortais.

Tico-tico no fubá

Fonte: Revista Isto é - 09/06/08
Vida de Carmen Miranda vira motivo de disputa

Por Celina Côrtes

"Taí, eu fiz tudo pra você gostar de mim/ Oh meu bem não faz assim comigo, não/ Você tem, você tem que me dar seu coração." A marchinha de Joubert de Carvalho, um dos maiores sucessos de Carmen Miranda, retrata bem o temperamento generoso da Pequena Notável, que do alto de seu 1,53 m nunca mediu esforços para agradar ao público e aos amigos que a cercavam. Passados 51 anos de sua morte, o uso de sua imagem motiva uma disputa judicial injusta com um dos maiores mitos nacionais. A briga envolve os herdeiros, a ex-mulher de Caetano Veloso, Paula Lavigne, o escritor Ruy Castro e o diretor de cinema Aníbal Massaini Neto.
Em 1998, a produtora Rio Vermelho arrematou por US$ 200 mil (cerca deR$ 400 mil) os direitos sobre a imagem de Carmen Miranda. Era um dos projetos mais ambiciosos das sócias Paula Lavigne e Renata de Almeida Magalhães,que planejavam fazer um filme. Acabaram envolvidas em um projeto da Rede Globo de lançar uma minissérie antes do centenário de Carmen, que se completa em fevereiro de 2009.

Quase ao mesmo tempo, Massaini, diretor do documentário Pelé eterno, ambicionava realizar um sonho de seu pai, Oswaldo, e levar Carmen às telas. Para isso, sondou seu colega Carlos Manga para dirigir uma produção sobre a artista. O veterano Manga, porém, abandonou a família Massaini e embarcou no projeto da minissérie da Globo, convidando, inclusive, a novelista Maria Adelaide Amaral para escrevê-la. “A idéia ficou só no desejo”, lamenta Massaini. O problema é que os dois projetos – o da Globo e o de Massaini – são alvo de processos movidos pela Copyrights Consultoria Ltda., representante dos herdeiros de Carmen, que temem pelo uso da imagem da artista.

Carlos Manga planeja minissérie
Paula Lavigne tem os direitos
Aníbal Massaini quer fazer filme
Ruy Castro se associou à Globo

“Em tese, a produtora (Rio Vermelho) não teria o direito de fazer o filme porque o contrato com eles termina este mês”, alega a advogada da Copyrights, Adriana Vendramini. O que se sabe é que só 10% do valor do contrato foi quitado. Mas a produtora acaba de obter o direito de pagar o restante da dívida em juízo. “Cumpro o que a Justiça determinar”, rebate Paula Lavigne. Outra envolvida é a empresa americana CMG Worldwild, com escritório no Rio. Entre as 300 celebridades cujos direitos de imagem estão sob seus cuidados estão Marilyn Monroe, James Dean e, claro, Carmen Miranda. Verdinhas à vista: “Há interesse dos estúdios americanos em fazer um filme sobre Carmen”, antecipa a diretora Kitty Monte Alto.

O escritor Ruy Castro, autor de biografias como a de Garrincha e a de Nelson Rodrigues, que vendeu no ano passado à Globo os direitos sobre seu livro Carmen: uma biografia – a vida de Carmen Miranda, a brasileira mais famosa do século XX, um calhamaço de 600 páginas, parece perdido diante de tanta polêmica. “Não há impasse, apenas um desencontro momentâneo”, acredita Castro. A Central Globo de Comunicação informa que os direitos do livro foram comprados por R$ 50 mil,“como os de várias outras obras”, mas alega que o projeto ainda está em estudos. Quem conheceu Carmen de perto fica triste diante desse quiproquó. “Ela foi muito especial, isso não tem nada a ver conosco”, suspira Carmen Guimarães, 70 anos, filha de Cecília, única dos seis irmãos ainda viva, com 92 anos.

Mitos da lição de casa

Fonte: Revista Isto é - 09/06/08
Excesso de tarefas e cobrança dospais durante o estudo são errosapontados por educadores

Por Lena Castellón

A cena é comum. Caderno aberto, livro num canto e a cara aborrecida. Não da criança, mas da mãe. Discutir por causa da letra é praxe. Assim como irritar-se devido à lentidão na execução dos exercícios ou desesperar-se porque o herdeiro não entende o que ela cansou de repetir. A lição de casa virou um tormento para muitos pais. Especialmente agora, quando os estudantes correm contra o tempo para evitar a recuperação. A “ameaça” faz aumentar a pressão da família, a cobrança por um bom desempenho e os insistentes pedidos para que o filho se dedique mais ao estudo. Tudo isso sem deixar de lado o capricho nas tarefas.

Mas acrescentar horas ao período dedicado às atividades não ajuda a criança. Nem travar batalhas com o filho por causa da lição. É o que demonstra uma série de pesquisas feitas nos Estados Unidos. Levantamento da Universidade de Michigan com 2.900 jovens americanos revelou que o tempo gasto com as tarefas aumentou 51% entre 1981 e 2004. Outro trabalho, conduzido na Duke University, mostrou que esse acréscimo não trouxe melhora na performance. O estudo apontou ainda que os estudantes do ensino fundamental que dedicaram de 60 a 90 minutos diários para os deveres e os alunos do ensino médio que cumpriram mais de duas horas na execução deles tiraram as notas mais baixas.

Por esses e outros achados, o educador Alfie Kohn, autor do livro The homework myth (O mito da lição de casa, em tradução livre), propõe uma nova forma de trataro assunto. Para ele, as crianças poderiam trocar os exercícios convencionaispor atividades mais envolventes, como entrevistar os parentes para conhecer a história da família.

No Brasil, embora a escola não seja integral como nos Estados Unidos, também há defensores de novos meios de lidar com o dever. Motivos não faltam. A tarefa, quando executada apenas por obrigação, não estimula a aprendizagem. Cumprida sob as broncas dos pais, traz uma percepção negativa: aos olhos do filho, lição vira sinônimo de chatice. Com isso, as oportunidades de treinar e captar conceitos se diluem. “Ver o jogo de empurra diante do conhecimento me entristece. Há professores que passam o dever de ensinar para os pais, que o devolvem para a escola. Os alunos refletem esse descompromisso e também querem delegar para alguém a lição, seja para os irmãos, seja para a internet”, declara Nilce da Silva, professora da Faculdade de Educação da USP.

Para a Ph.D. em educação infantil Fátima Guerra Sousa, da Universidade de Brasília, o ideal seria oferecer horário integral para os jovens. Mas já que isso é raro no País, cabe aos colégios discutir quando e como passar lição de casa. “Eu reduziria a tarefa. Em alguns lugares, ela é o atestado de que a escola não consegue trabalhar a aprendizagem na perspectiva do prazer e do envolvimento do aluno”, afirma. Nas suas palavras, se o interesse é despertado de outra forma, não é necessário passar tantos exercícios para a casa. O próprio estudante vai atrás de informações. Fátima acha importante distinguir os níveis de ensino e é contra pedir tarefas para menores de seis anos. “O aprendizado deles ocorre por meio de brincadeiras”, considera.

Na visão de Clélia Pastorello, educadora de São Paulo, escolas com projeto educacional sempre revêem a lição. Esse esforço deve ser feito. Afinal, em certas escolas, dificilmente a tarefa direciona a criança e o adolescente a aprender por si. Outro problema é que os pais não sabem como participar. “Interferir não é um mal, desde que o adulto se coloque ao lado para estimular, não para dar respostas”, ensina Clélia. Quando os pais começam a palpitar demais nos trabalhos, eles prejudicam o desenvolvimento da autonomia das crianças. “Muitas famílias ficam estressadas com o que julgam estar errado e acabam assumindo a responsabilidade pela tarefa”, comenta a neuropsicóloga infantil Ana Olmos. A dica, portanto, é não interferir demais e controlar a vontade de apagar a lição. Ana tem ainda uma sugestão para aliviar os dilemas cotidianos: criar um horário para que a lição seja feita no colégio. Com isso, a criança aproveitaria melhor o tempo em casa, com direito a brincar e sentir prazer entre os seus. Seria um aprendizado e tanto.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

A nossa surpresa em Cannes

Fonte: Revista Época - 02/06/08

A atriz Sandra Corveloni arrebatou o júri do Festival e ganhou o segundo principal prêmio do cinema mundial logo na sua estréia

Rodrigo Turrer

"O prêmio me tirou da tristeza e da prostração"
Sandra Corveloni gastou a última semana explicando ao mundo quem é. “Minha rotina agora é dar entrevistas”, diz a atriz de 43 anos. Justificável. Afinal, a desconhecida Sandra embasbacou o mundo do cinema em Cannes ao desbancar as divas Juliane Moore e Angelina Jolie, arrebatar oito dos nove votos do júri e ser escolhida a melhor atriz do Festival por sua atuação em Linha de Passe, dos diretores Walter Salles e Daniela Thomas. De lá pra cá, ela trocou o relativamente pacato revezamento entre família, aulas de teatro que ministra e ensaios de peças, por uma média de dez entrevistas diárias. “Minha vida virou de cabeça pra baixo. Estou sempre pendurada no telefone.” O sinal das mudanças é visível. Sandra agora vive cercada por assessores, que monopolizam suas entrevistas e controlam seu tempo com rigor britânico. Também leva uma amiga a tiracolo, para ajudar com os celulares e relaxar de vez em quando, “porque ninguém é de ferro, né?!”. O espaço em branco nas folhas de sua agenda sumiu. Assim como sua voz, que de tanto falar com jornalistas ficou rouca. A transformação em celebridade instantânea ainda é recebida com estranhamento pelo marido, o professor de italiano Maurizio de Simone, com quem é casada há uma década, e pelo filho Orlando, de seis anos. “Ele não está entendendo nada, tadinho”, diz Sandra. Era com Orlando que ela brincava na sala da sua casa, na zona sul de São Paulo, “desligada do festival”, quando recebeu a ligação confirmando sua vitória. E dando início a vertiginosa caçada da imprensa por suas declarações. Tamanho assédio pode ser compreendido pelo ineditismo do feito de Sandra. Linha de Passe é sua estréia no cinema. Antes desse filme, ela havia trabalhado em meia dúzia de curtas experimentais. Seus vinte anos de carreira foram dedicados aos palcos. No papel de Cleuza, uma empregada doméstica moradora da periferia de São Paulo, grávida e mãe de quatro filhos que querem mudar de vida como jogadores de futebol, ela ganhou o principal prêmio cinematográfico do planeta depois do Oscar. É verdade que Cannes aposta em novatos - mas nem tanto. Sandra é uma das raras atrizes a emplacar com o troféu máximo do festival logo de cara. Nessa entrevista, ela fala sobre essa conquista, as dificuldades para se tornar atriz profissional, e como o prêmio a ajudou a sair de uma tristeza profunda por causa da perda de uma gravidez.
ÉPOCA - Como você soube que havia recebido o prêmio?
Sandra Corveloni - Eu sabia que, por volta de três horas da tarde, estava começando a cerimônia de premiação, e pensei em entrar em contato com a Daniela [Thomas, diretora do filme com Walter Salles], em Cannes. Mas não liguei. Comecei a brincar com o meu filho, fazer as minhas coisas, e estava desligada de Cannes quando tocou o telefone. Era a Ana Luiza, assessora de imprensa do Linha de Passe. Estava uma loucura, porque ela falava comigo, falava com o Walter, com todo mundo que estava do lado dela, uma baita confusão. Ela me deu parabéns e eu perguntava: “parabéns por quê?”. Em seguida, ela me disse que ligaria depois, de novo. Fui para internet procurar, e nada. Logo ela me ligou, e disse “confirmadíssimo! Você ganhou o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes”. Foi uma gritaria, uma choradeira. Meu filho não entendia nada, perguntou se minha peça tinha ganhado.
ÉPOCA - Você esperava ser escolhida quase por unanimidade como melhor atriz?
Sandra - Eu esperava um prêmio coletivo. Sempre torci por isso. Mas eu não esperava que a minha personagem arrebatasse o júri dessa maneira. Eu achei que o filme tinha potencial, poderia até ganhar como melhor filme. A história vai fundo na alma da família, na ausência de um pai, das oportunidades escassas, da violência, um tipo de realidade de muitas famílias brasileiras. E é um filme coletivo. Apesar de a Cleuza ser a única mulher, a mãe, ou como disse o Walter Salles, a coluna moral para onde os filhos sempre voltam, ela não é a protagonista. Por isso nunca passou pela minha cabeça que eu poderia ganhar.
ÉPOCA - O que significou pra você essa premiação?
Sandra - Olha... a ficha ainda não caiu. Claro que estou felicíssima, honradíssima. Abre uma janela enorme para mim. Mas está uma loucura, porque logo que soube da premiação começaram os telefonemas e as entrevistas. Minha vida virou de cabeça pra baixo. Eu tenho falado pelos cotovelos. Todo mundo quer saber como foi. E é normal. A gente tem de compartilhar mesmo.
ÉPOCA - Quais as principais mudanças que você sentiu na sua rotina?
Sandra - Minha rotina agora é dar entrevistas. Eu estou sempre pendurada no telefone. Em casa, eu não consigo. Tento manter um tempo para ficar com meu filho, fazer as coisas da escola com ele, mas está bem difícil. De domingo à tarde até agora tenho dado quase dez entrevistas por dia. Está impossível ficar com ele, conversar. Até pra comer, dormir, trocar de roupa está difícil.
ÉPOCA - E sua família?
Sandra - Meu filho Orlando, de seis anos, não está entendendo nada, tadinho. Aliás, outro dia na TV disseram que ele tinha cinco anos, e ele ficou bravo. Disse: “eles falaram que tenho cinco. Mas eu tenho seis. E meio” (risos).
ÉPOCA - Você é uma atriz de teatro consagrada, com mais de 20 anos de carreira, mas nunca teve tanta atenção da mídia como agora. Esse assédio, digamos, tardio, da imprensa a incomoda?
Sandra - Não. Acho supernatural que as pessoas queiram saber. É importante. Claro, a gente de teatro batalha pra conseguir matéria e tem dificuldade para sair em jornais e revistas. Mas, ao mesmo tempo, acho que estou divulgando o trabalho do teatro e dos atores, além do filme. É um trabalho que vai levar para o mundo inteiro uma realidade do cinema e do teatro brasileiro, porque no filme tem uma porção de gente de teatro.
ÉPOCA - Como foi passar do teatro para o cinema?
Sandra - Foi bem tranqüilo. Trabalhei muito com a Fátima Toledo [preparadora de elenco]. E o Walter e a Daniela sabiam exatamente o que queriam. Foi um processo profundo de trabalho, sem correria, sem pressa para ficar pronto. Então foi fácil. Claro, sou atriz de teatro, e um pouco exagerada por natureza. Então, no começo, eu sempre era alertada, “menos, Sandra, menos”. Mas depois foi natural, e não senti tanta diferença.
ÉPOCA - Por que você demorou para estrear no cinema?
Sandra - Eu já tinha feitos alguns testes antes. Mas sempre perdi oportunidades porque estava muito envolvida com o trabalho no teatro. Às vezes não dava para conciliar. Dessa vez a Denise Weinbberg [atriz], que está no filme, me indicou para fazer o teste. Eu fiz uma vez, eles gostaram, fiz outro... No total, fiz três testes com a preparadora de atores, e um teste para câmera. Eles aprofundaram os testes e gostaram. E eles também sabiam o que queriam, o que estavam procurando, o que ajudou muito.
ÉPOCA - No filme você interpreta uma mãe-coragem, uma mulher que vive na periferia e é mãe e pai de quatro garotos que sonham em mudar de vida como jogadores de futebol. Aquela paisagem da periferia não é totalmente estranha para você, certo?
Sandra - Não. Como já fiz teatro em muitos lugares de São Paulo, conheço bem a cidade. Não me assustou aquela periferia da Zona Leste, mesmo tendo ficado lá só uma semana. Participava de caravanas da prefeitura e já me apresentei em todos os lugares possíveis, fiz espetáculos itinerantes nos confins da Zona Sul à Zona Norte. Você passa por tudo. Conheço muito São Paulo e sabia como era.
ÉPOCA - Mas você também vem de uma família humilde, não?
Sandra - Sim. Nasci em Flórida Paulista, no interior de São Paulo, e vim para a capital [paulista] com cinco anos. Eu, meus pais, uma irmã e um irmão mais velhos. Meu pai era agricultor, tinha um sítio lá e as coisas estavam difíceis. Ele se cansou daquela vida e resolveu aproveitar um convite de uma tia minha, que prometeu ajudar e sabia de um trabalho pra ele, numa gráfica. Viemos morar em Pirituba. Mas, na minha infância, ali era bem mais tranqüilo. Pirituba parecia uma cidade do interior, todo mundo se conhecia, a gente ia a pé pra escola. Então, meu conhecimento da periferia é muito mais pelas minhas viagens por São Paulo.
ÉPOCA - E como você começou a estudar teatro?
Sandra - Queria alguma coisa, mas não sabia o que era. Tinha feito colégio técnico no Senai e estava bem encaminhada. Havia ido bem num estágio no Instituto de Pesquisas Tecnológicas da USP, e arrumei um emprego bacana. Mas não estava feliz. Quer dizer, tinha 19 anos, ganhava superbem, fazia um trabalho legal, que eu gostava, mas... não estava bem. Então comecei a fazer umas aulas de dança, de expressão corporal, e percebi que aquilo tinha a ver comigo. Comecei a procurar coisas mais específicas no teatro, e fiz uma oficina no Sesc Pompéia. Me apaixonei. Aí emendei uma coisa na outra. Montei grupos de teatro amador, depois de me formar no Tuca [Teatro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo]. E logo depois, em 1991, fiz Beckett In White, minha estréia profissional. Foi quando participei de uma oficina no Tapa [coletivo teatral paulista], e fiquei. Faço trabalhos com outros grupos, claro, mas estou no Tapa há uns 15 anos. Sempre em contato com eles.
ÉPOCA - Você passou por muitas dificuldades pra se tornar atriz, então?
Sandra - Nossa! Levei muita porta na cara e balde de água fria na cabeça. Fiz teatro em empresas, para alertar sobre segurança no trabalho e era horrível. Quando fazia escola de teatro, fiz até animação de festa infantil. Era uma loucura. Um dia, estava vestida de Emília do Sítio do Pica-pau Amarelo e as crianças cortaram minha peruca. Aí falei: “chega” e larguei isso. Mas fazer teatro é sempre meio difícil.
ÉPOCA - Sei que é um assunto delicado, mas você sofreu um aborto recentemente. Como é lidar com dois sentimentos tão distantes: a dor pessoal da perda, e a conquista profissional inesperada?
Sandra - Na verdade sofri um parto prematuro. Era um bebê grande, de cinco meses, bem desenvolvido. Foi complicado. Tive várias complicações, passei por cirurgias. Foi uma loucura. Isso foi no dia 6 de maio. Por isso eu não fui pra Cannes. Mas realmente é estranho. [Silêncio] Isso me tirou da tristeza, um pouco. Me obrigou a levantar de qualquer jeito. Foi um presente na minha vida. Me tirou da tristeza e da prostração. Estava muito, muito, muito triste. Com o prêmio, tive que sacudir a poeira e virar meu pensamento, mudar o foco completamente. E de uma certa forma foi muito bom, eu melhorei. Fiquei melhor emocionalmente.
ÉPOCA - Como você não foi para Cannes, ainda não recebeu o prêmio em mãos, certo?
Sandra - Não. Acho que vou pegá-lo só nesta semana. Estou ansiosa para ver o Walter voltar de Cannes com o prêmio. Vamos nos encontrar para conversar sobre o filme, porque ainda tem muita coisa para acontecer, foi só o primeiro festival. Vou ficar feliz quando receber, porque é o símbolo disso tudo que está acontecendo.
ÉPOCA - Você está ansiosa quanto ao futuro? Já tem novos projetos?
Sandra - Vou trabalhar na divulgação do filme, que estréia no segundo semestre. E tenho muitos projetos com o Grupo Tapa. Eu continuo de co-dirigindo o espetáculo “Amargo Siciliano”. Ainda não recebi novos convites profissionais.
ÉPOCA - Acha que pode ser indicada para novas premiações? Um Oscar, como a Fernanda Montenegro depois de ganhar o Festival de Berlim por "Central do Brasil"?
Sandra - Não penso muito nisso, para ser sincera. Tudo pode acontecer, mas não quero ficar criando expectativas, viajando nessas. Sou muito pé-no-chão, e não gosto de contar com o ovo dentro da galinha.

Infantil maduro

Fonte: Revista Veja - 02/06/08
Com seu segundo episódio, Príncipe Caspian, a série Nárnia ganha em intriga e intensidade

Isabela Boscov

William Moseley, como um dos irmãos Pevensie: batalhas violentas – mas sem sangue

Que seria dos autores de fábulas sem recursos como o que dá mote a As Crônicas de Nárnia – Príncipe Caspian (The Chronicles of Narnia: Prince Caspian, Estados Unidos/Inglaterra, 2008)? No primeiro filme da série baseada nos livros do irlandês C.S. Lewis, os quatro irmãos Pevensie iam parar na terra encantada do título, da qual descobriam ser os soberanos. Nesta continuação, desde sexta-feira em cartaz no país, os Pevensie, depois de cumprirem um longo reinado, estão de volta a seu tempo e lugar originais – a Inglaterra da II Guerra. Para eles, apenas um ano se passou; mas, em Nárnia, para onde são reconvocados por um chamado mágico, algo como 1.000 anos transcorreram. Seu antigo reino está em ruínas, e seus habitantes foram quase todos dizimados pelo reino vizinho de Telmar. Aí, também, algo vai mal: um nobre usurpou o trono do herdeiro legítimo, o príncipe Caspian, e não vai descansar até tê-lo assassinado. Caspian é quem chama os irmãos de volta: sem o seu amparo e a influência que eles podem exercer sobre os narnianos remanescentes, ele não tem chance sequer de sobreviver, quanto mais de destronar o ganancioso rei Miraz (o italiano Sergio Castellitto, em grande forma). O truque da discrepância temporal – um ano numa dimensão, dez séculos em outra – faz parte do feijão-com-arroz dos autores de fantasia, e não se pode acusá-lo de originalidade. Mas aqui ele se presta a pelo menos uma vantagem: da mesma forma que os protagonistas, obrigados a olhar de frente os escombros de seu passado glorioso, também o enredo e o estilo cresceram.

A exemplo de Harry Potter, o calcanhar-de-aquiles de Nárnia está no seu elenco principal, que vai crescendo sem manifestar grande talento. Ben Barnes, que interpreta Caspian, é uma presença agradável, embora prejudicada pelas falas genéricas e pelo cabelo com jeito de quem acabou de fazer escova. Mas trata-se de pormenores: agora, a intriga pelo poder é sombria, Telmar e Nárnia têm uma questão de vida ou morte a decidir, e as batalhas são consideravelmente mais violentas (embora livres de sangue). Para o público infantil, responsável pela bilheteria estrondosa do primeiro episódio, esta seqüência parecerá um bocado mais assustadora. Mas também bem mais compensadora. Com sorte, Nárnia há de seguir Harry Potter também em outro caminho, o do amadurecimento criativo – e, quem sabe, chegar ao terceiro filme surpreendendo não só pela boa vontade, mas pela originalidade.