domingo, 2 de setembro de 2007

Como conciliar arte com público

*Fonte: Jornal Estado de São Paulo - http://txt.estado.com.br/editorias/2007/09/02/index.xml

Na relação entre o ofício cinematográfico e a televisão, a busca por um caminho que reúna o melhor dos dois mundos

Paulo Morelli

(...)resultado. Outras diferenças são marcantes. A tela de TV é minúscula comparada à do cinema. Por isso, na TV as cenas são apresentadas em close, enquanto no cinema closes excessivos podem tornar-se sufocantes. Por outro lado, os planos gerais são bem-vindos no cinema e perdem sua força na TV. Outro ponto é o comportamento da câmera. Na TV ela é distante, quase sempre em 3ª pessoa, não se envolve. Já no cinema a câmera participa do foco narrativo, age na cena, comenta, revela. Enquadramento, posição e atitude da câmera são a matéria-prima da linguagem.

Mas creio que a maior diferença entre os dois meios se dá na narrativa e concepção artística de cada um. A TV fica geralmente numa sala iluminada, onde as pessoas circulam e conversam. Para competir com todo esse ruído, os programas têm de usar cenários ultra-iluminados e diálogos que se repetem e repetem e repetem. Tudo o mais explícito possível. Já no cinema, a sala escura nos leva à imersão total. Lá, o cinema revela sua verdadeira natureza: a imagem, o silêncio, o não dito, o subliminar. Em outras palavras, cinematografia. O cinema é a grande arte da modernidade. A TV por sua vez, é o mais poderoso meio de comunicação de massas.

Apesar de suas diferenças de origem, os dois meios têm atuado lado a lado na batalha para conquistar a atenção do público. Com a retomada do cinema no Brasil, a partir dos anos 90, uma nova geração de cineastas chegou às telas. Mais de 120 novos diretores estrearam nesse período e o cinema virou um caldeirão de influências, com autores vindo das mais variadas áreas: teatro, literatura, publicidade, vídeo, televisão, além do cinema. Essa efervescência produziu filmes ousados e que, mesmo assim (ou por isso mesmo), cativaram os espectadores. Uma nova linguagem cinematográfica passou a ser exercida e o público reagiu enchendo as salas.

Dentre esses cineastas, uma parte significativa veio da TV. Os nomes que mais se destacam são Guel Arraes e Daniel Filho, que juntos fizeram mais de 12 milhões de espectadores. São diretores que construíram uma cinematografia própria e fizeram a ponte entre TV e cinema. E mais uma vez o público respondeu, comparecendo.

Mas nem tudo são rosas. Muitos e diversos são os cinemas feitos no Brasil, com linguagens e enfoques às vezes antagônicos. Nos dois extremos desse amplo leque, vejo duas vertentes que levam o cinema a um impasse. De um lado, o cinema intelectualizado, que não se importa com o público, e do outro, o cinema comercial que pretende conquistar o público a qualquer preço.

O cinema intelectual e cerebral desconstrói a narrativa e traz consigo um raciocínio perverso. A crença de que fazer arte e ser criativo é antes de tudo romper regras. Isso se torna para alguns uma regra absoluta: Hay regras? Sou contra! É como se dissessem 'sou um artista, quem me compreendeu muito bem, quem não me seguiu, sinto muito'. Quando um artista se coloca acima dos outros não há meio termo: ou ele é genial, e temos uma obra de arte, ou o filme fica ruim, já que não aceita críticas e sem críticas não há aprendizado. O público desses filmes acaba sendo muito restrito.

Já o cinema puramente comercial destrói o que existe de mais puro e genuíno nessa arte, ao vulgarizar a linguagem cinematográfica, imitando de maneira preguiçosa a estética do seu primo mais novo, a TV. Esses cineastas tratam o público como se fosse incapaz de perceber sutilezas. É como se dissessem 'não adianta fazer melhor que isso, porque o público é limitado e não percebe a diferença'. Quem pensa assim, esconde-se em um tímido: Hay regras? Quero todas! O público desses filmes deixa de conhecer o potencial do verdadeiro cinema.

Esses dois grupos, a meu ver, sofrem do mesmo mal: falta de respeito pelo público. O público é uma entidade curiosa. No dia-a-dia, as pessoas fazem besteiras, se embaralham, não sabem lidar com suas emoções e não conseguem ter uma visão do todo. Mas quando vêem um filme, essas mesmas pessoas percebem claramente as emoções em jogo, reconhecem o subtexto e as intenções ocultas que mobilizam as personagens. O que na vida é difícil de perceber, na arte fica transparente. Por isso, se houvesse um ensinamento, ele seria: respeite o público, ele é muito mais inteligente do que você imagina.

Prefiro acreditar que no meio desse leque de cinematografias exista um caminho que une o melhor dos dois mundos. Ou seja, arte para o público. Basta lembrar os dois gênios que perdemos recentemente, Bergman e Antonioni. Filmes de artistas como eles comovem, perturbam, transformam quem os vê. São a própria essência do cinema e da arte e estão acima das questões de mercado. Serão lembrados e reverenciados para sempre porque revelam nossa humanidade. E ousaria dizer que ao longo das gerações eles serão vistos por mais gente que muitos blockbusters. Alguém duvida que daqui a 200 anos Bergman continuará sendo visto?

Conciliar arte com público é algo que muitos já fizeram com sucesso, de Coppola a Walter Salles, de Almodóvar a Cao Hamburger, de Kubrick a Meirelles. Ou, então, o maior exemplo de todos (tudo bem, não é cinema, mas é arte), Shakespeare. Esses artistas são narradores de histórias que projetam o inconsciente humano na parede da caverna.

Cinema não é ciência exata, aliás, não é ciência e muito menos exata. É lançar-se no vazio sem rede de segurança. Confiar na intuição e nada mais. Fazer escolhas e apostar em incertezas. Andar no fio da navalha, e descalço! Que é possível, é. Mas é uma coisa difícil de se fazer.

Paulo Morelli é cineasta, autor de Cidade dos Homens, em cartaz nos cinemas

Quero ser Quentin Tarantino

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Curta-metragem com Selton Mello e Seu Jorge decifra os segredos do diretor de Kill Bill

Gustavo Miller

Para quem não conseguiu ver o filme Tarantino’s Mind, no Festival Internacional de Curtas de São Paulo, na semana passada, uma boa notícia: ele já está na internet há um tempinho...

Dirigido por 300 ML, o curta-metragem de 15 minutos mostra Selton Mello e Seu Jorge em um bar vazio de São Paulo. Entre batatas fritas e copos de chope, os dois conversam sobre uma possível teoria de que todos os personagens dos filmes de Quentin Tarantino têm uma ligação em comum. O roteiro é ótimo, com diálogos cheios de irônia e palavrões. Resumindo: Tarantino puro. Vai lá: http://tinyurl.com/3xpgw2.

Estréia programa filmado por celulares

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Estréia às 21h45 desta terça-feira, dia 4, o programa Retrato Celular, no Multishow. Composto por oito episódios e dirigido por Andrucha Waddington, o show mostra o universo de 34 pessoas entre 21 e 30 anos. O barato do programa é que cada um deles filmou a sua vida por meio de um telefone celular.

O fenômeno dos blogs

*Fonte: Jornal Estado de São Paulo - http://txt.estado.com.br/editorias/2007/09/02/index.xml

Surgido há 10 anos, o fenômeno dos blogs transforma todos em autores

A blogosfera é infinita em sua capacidade de absorver novos integrantes. Seria habitada atualmente por 70 milhões de blogs. A cada dia são criados mais 120 mil, pelas projeções do site especializado Technorati. Esse universo, que tem mostrado um crescimento em projeção geométrica, nasceu acidentalmente quando um programador de computador, o americano John Barger, resolveu preencher o seu cotidiano colocando links e comentários em seu site Robot Wisdom. Fez isso há dez anos.

Barger batizou a sua coluna diária de assuntos gerais de 'weblog', algo como 'registro da web'. Ela era dividida em temas como 'diversão', 'rede', 'arte', 'tecnologia', 'história', 'ciência' e 'compras'. O nome, reduzido para blog, pegou e, dez anos depois, a chamada blogosfera é tema de debate e estudos acadêmicos.

Serviços gratuitos especializados em blogs, como o Wordpress e o Blogger, derrubaram as barreiras técnicas e econômicas para que cada internauta passasse a ser um autor na internet.

Existem pesquisas analisando a extensão do fenômeno. Caso, por exemplo, do livro do pesquisador Daniel Drezer, da Universidade de Chicago, que apresenta os blogs como os fóruns políticos da contemporaneidade, em The power and politics of blogs.

A razão do fascínio desse espaço eletrônico gira em torno do poder multiplicador das opiniões ali endereçadas. Uma espécie de revisitação da ágora dos tempos greco-romanos. Um espaço público a que todos têm acesso. Um canal aberto para todo o tipo manifestação. Sem censura ou filtro.

Todo esse potencial de crescimento abre outras questões: Quem são os receptores de toda essa oferta de palpites, opiniões e informações que circulam na rede? E que efeitos esse canal democrático de expressão promove?

Os blogs já têm sido incorporados por grandes grupos empresariais, como um instrumento a mais de aproximação com funcionários e consumidores. Até mesmo executivos e dirigentes investem nesses canais de comunicação.

Na pauta sobre o futuro dos blogs também está o papel do jornalismo tradicional, tido até a entrada deles em cena, como uma espécie de guardião da transmissão de notícias e da hierarquização de sua importância para o leitor.

Hoje, a primeira página dos portais de notícias deixou de ser a única entrada para a informação. Muitos leitores chegam às notícias publicadas por esses portais por outros meios, como blogs, listas de discussão e por buscadores como o Google e o Yahoo.