segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Joe Wright reinventa o desejo de reparação de Ian McEwan

Fonte: Jornal O Estado de São Paulo - 22/10/07

Filme com a musa do diretor, Keyra Knightley, acrescenta à discussão sobre literatura uma outra, sobre o próprio cinema

Joe Wright acaba de dirigir um comercial milionário da marca Chanel. Keira Knightley é a estrela. Está linda, num longo de seda que mapeia seu corpo. Keira está em Desejo e Reparação, que Wright adaptou do romance de Ian McEwan - editado no Brasil somente como Reparação -, e também em Orgulho e Preconceito, que ele havia adaptado de Jane Austen. Prepare-se para um dos choques desta Mostra, como O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford, de Andrew Dominik, e Sombras de Goya, de Milos Forman. Os três tratam da ambivalência humana e discutem arte e vida. A literatura e o cinema em Desejo; o teatro, no Assassinato: e a pintura em Goya.

Pode-se gostar do filme de Joe Wright exatamente pelo que muitos críticos contestam nele - o excesso. Na sessão para a imprensa, sábado de manhã, havia gente reclamando, gente que em geral leu o livro e acha que o diretor carrega nos excessos melodramáticos na segunda parte. A chave para se entender Desejo e Reparação está naquela praia, durante a guerra. O diretor constrói um plano-seqüência que parece puro virtuosismo técnico, mas propõe algo mais. Sua idéia é que a guerra é este limite, não apenas para os indivíduos, mas para as sociedades.

A sociedade britânica de Desejo e Reparação parece aquela filmada por Joseph Losey - baseia-se no embate entre as classes sociais. Muito da tragédia que ocorre no filme - uma menina de 13 anos interpreta mal o que viu e, baseada nos seus preconceitos (e eles também são ditados pelo desejo ), condena um homem num caso de estupro. Este homem ocorre ser de uma classe inferior e também de ser o amado de sua irmã. Ele sofre o Diabo. Na cena da praia, devorado pela febre, o herói busca água e vai parar num cinema, reduzido a um nada diante da tela gigante que mostra Michèle Morgan e Jean Gabin em Cais das Sombras, de Marcel Carné, de 1938.

Será a arte, o cinema, maior que a vida? É esta a idéia que está em discussão em Desejo e Reparação. No livro, é a literatura, e Joe Wright mantém a discussão, com a entrada em cena de Vanessa Redgrave, para uma participação memorável, que só uma atriz como ela pode proporcionar. Mas à discussão sobre literatura, que é a do livro, ele soma essa outra sobre o cinema. Van Gogh disse, num carta ao irmão Theo, que pintava para consolar. Esse consolo tem aqui outro nome, reparação. Desejo e reparação. Desejo DE reparação. Keira, não é preciso nem dizer, é maravilhosa.

(SERVIÇO)
Serviço Cinemark ShoppingEldorado, sala 7: Hoje, 22 horas. IG Cine: quarta, dia 24, 19 horas. Reserva Cultural, dia 1.º, 16h10.Cotação: Ótimo

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