segunda-feira, 19 de maio de 2008

A volta de Indiana Jones

Fonte: Revista Isto é - Acesso em 19/05/08 - http://www.istoe.com.br/

Ausente dos cinemas há duas décadas e agora interpretado por um Harrison Ford sessentão, o popular herói dos filmes de aventura retorna em Indiana Jones e o reino da caveira de cristal

IVAN CLAUDIO Colaborou Natália Rangel

EM FORMA Indiana Jones (Harrison Ford) briga com um soldado russo na nova aventura filmada, em parte, em florestas do Havaí

As novas gerações não viram Indiana Jones nos cinemas – a sua última aparição nas telas aconteceu em 1989. Pois bem, um dos heróis recentes mais aclamados dos filmes de aventura está de volta depois de quase duas décadas de descanso em sua quarta e eletrizante apresentação, no aguardado filme Indiana Jones e o reino da caveira de cristal – estréia no Brasil e em diversos países no feriado da quinta-feira 22. O seu retorno marca também o reencontro de três das maiores estrelas de Hollywood: Steven Spielberg, diretor de toda a série, George Lucas, criador do personagem e dos enredos, e o ator Harrison Ford, que aos 65 anos encarna mais uma vez o corajoso e bem-humorado Indiana. É para as novas gerações que se endereça a atual versão: Indiana Jones é um professor e arqueólogo americano que enfrenta tribos selvagens, árabes ensandecidos e nazistas armados até aos dentes em explorações arriscadas nos confins do mundo, tudo para ganhar a posse de raridades arqueológicas dotadas de poderes sobrenaturais. Apesar da coragem com que enfrenta perigos de toda ordem, ele tem um ponto fraco: morre de medo de cobras. Uma de suas idiossincrasias, comum em todas as histórias anteriores e que até virou parte de seu charme, continua presente: o personagem veste no calor dos trópicos uma jaqueta de couro, não a tira sob nenhum pretexto, e usa um chapéu de feltro mais apropriado ao inverno dos EUA. Mantém ainda o seu chicote afiado. As três aventuras (a primeira foi em 1981), que estão sendo relançadas em DVD, renderam em bilheteria cerca de US$ 1,18 bilhão.

O arqueólogo conta a com a ajuda de Mutt (Shia LaBeouf) e Marion (Karen Allen)

Desde que foi anunciada a filmagem desse quarto episódio, uma superprodução de US$ 125 milhões, ele passou por diversos títulos. Alguns deles: Indiana Jones e a cidade dos deuses, Indiana Jones e o destruidor dos mundos, Indiana Jones e os quatro cantos da terra, Indiana Jones e a cidade perdida do ouro, Indiana Jones em busca da santa aliança. Como parte de uma calculada estratégia de marketing, toda vez que Spielberg se referia ao novo trabalho dizia apenas que estava se divertindo bastante com “Indiana Jones e ...” – soletrava então, de forma incompreensível, qualquer coisa sem sentido. A expectativa foi crescendo até que o ator Shia LaBeouf, que interpreta o novo parceiro de aventuras de Indiana, soltou o título da produção durante o MTV Music Awards, em setembro do ano passado. A partir daí, o tal “reino da caveira de cristal” passou a cintilar na curiosidade dos fãs, mas ninguém estava autorizado a dizer nada sobre o que se passava dentro dos quatro estúdios em que Spielberg enfurnou-se por três meses (as cenas de florestas tiveram locações naturais no Havaí). Como quem guarda um tesouro, o diretor exigiu que os atores e toda a equipe técnica assinassem um termo de compromisso que os proibia de revelar qualquer detalhe da produção. Foi o ator Tyler Nelson quem cometeu a inconfidência. Mero figurante do filme (interpreta um soldado russo que dança balalaica), ele concedeu entrevista a um jornal de sua cidade natal, a obscura Edmond, em Oklahoma, revelando que a história mostrava Indiana Jones e o exército soviético brigando por uma relíquia de quartzo. Foi processado por Spielberg e na montagem final cortaram a sua dança folclórica.

Passada em 1957, em plena Guerra Fria, que opôs o países capitalistas e comunistas (respectivamente capitaneados pelos EUA e pela extinta União Soviética), a trama mostra Indiana Jones numa expedição particular ao Peru em busca da tal peça sumida. Não se trata de uma relíquia qualquer: o objeto sagrado pertence ao reino de Akator (referência ao reino subterrâneo de Akakor, que teria existido na fronteira entre o Brasil e o Peru) e guarda poderes desconhecidos que podem levar um povo a dominar o planeta. Os russos, por exemplo, e seu batalhão de homens de verde. À frente deles está a bela e fria oficial Irina Spalko, cujo papel ficou a cargo de Cate Blanchett. Spielberg quis que Cate tivesse ares da estrela alemã Marlene Dietrich, famosa por interpretar espiãs nos anos 30. Do outro lado do confronto, está Indiana e ele ganhou um amigo bem mais jovem, o “rebelde sem causa” Mutt Williams, interpretado por Shia LaBeouf. Spielberg pediu que o ator assistisse aos filmes Juventude transviada (com James Dean) e O selvagem (com Marlon Brando) para que entrasse no clima de seu personagem. LaBeouf não economizou na brilhantina do topete empinado. Algo pode parecer errado para os saudosistas que esperam ver na tela um personagem estacionado no tempo no que diz respeito a sua idade – ou seja, esperam pelo Indiana Jones jovem das três aventuras anteriores. É justamente aí que está um dos golpes de mestre de Lucas e Spielberg: eles envelheceram 20 anos o personagem para, dessa forma, poderem manter o galã Harrison Ford nesse papel. Tem-se, assim, um Indiana Jones sessentão.

Esse foi, com certeza, um dos fatores que emperraram o projeto desse quarto episódio: ainda que quisesse, Ford não conseguiria encarnar um Indiana com o mesmo vigor de duas décadas atrás. Ele está em forma, mas o tempo é implacável também para os astros e impõe os seus limites. Segundo o ator, que se submeteu a uma dieta de proteínas e a três horas diárias de academia, basta colocar o chapéu de feltro e a jaqueta de couro para o personagem “baixar” novamente. E ele jura ter dispensado dublês em muitas cenas de ação: “No primeiro filme eu rompi um ligamento do joelho, no segundo tive um problema nas costas que me levou à cirurgia em meio às filmagens. Agora, apesar de mais velho, não saí com nenhum machucado.” Há, no entanto, outro motivo para a demora no retorno do herói às telas. Em entrevista à revista americana Vanity Fair, Lucas contou que tanto Spielberg quanto Ford não gostavam da história que ele havia lhes apresentado, ainda em 1993. Nesse ano, Lucas se encontrara com Ford nas filmagens do seriado de tevê O jovem Indiana Jones e veio então a idéia de retomar a saga, desde que estivesse presente nela a tal caveira de cristal. “Sem a caveira, nada de Indiana”, dizia Lucas. Ao longo de 15 anos a história foi sendo desenvolvida por roteiristas do porte de N. Night Shyamalan (O sexto sentido), Frank Darabont (Um sonho de liberdade) e Chris Columbus (Harry Potter e a câmera secreta). Chegou- se enfim a um acordo (caveira mantida) justamente com a versão que envelhecia o herói. “O personagem batia com a minha idade, vivia um outro momento histórico e o que li era um grande roteiro. Então respondi: legal, vamos fazer mais um”, disse Ford. Com esses ajusajustes, outras novidades foram sendo incorporadas. A primeira delas é que, com a ação no período da Guerra Fria, a referência cinematográfica não deveria mais ser os matinês dos anos 30: a trama tem agora um jeitão de ficção científica série B. Não faltam, é claro, as impagáveis cenas de areia movediça, típicas dessas produções mais baratas.

VILÃ Cate Blanchett interpreta a militar Irina Spalko, em raro papel de ação

Sempre perfeccionista, Spielberg mandou o fotógrafo Janusz Kaminski “estudar” todos os títulos anteriores filmados por Douglas Slocombe para que o visual do presente não destoasse demais. Outra operação se deu em relação à reconstituição de cenários, como a Universidade Marshall, onde Indiana Jones dá aula com o nome de Henry Jones. O diretor evitou também o ritmo frenético dos blockbusters atuais porque acredita que o humor e a graça do personagem e das situações que ele vive vêm da tradição da comédia muda de Charles Chaplin e Buster Keaton. “Para conseguir o lado cômico que procuro nos filmes de Indiana, só mesmo sendo fora de moda”, disse Spielberg ao jornal The New York Times. Resta saber, no entanto, se a nova geração, que não teve a felicidade de ver Indiana Jones nos cinemas, vai gostar desse estilo cool e pleno de referências ao passado. Em 1981, quando Lucas e Spielberg revolucionaram os filmes de aventura, eles eram os grandes e terríveis rebeldes em Hollywood – Spielberg tinha 35 anos e ainda não filmara o seu clássico E.T. – o extraterrestre; Lucas contava 37 anos e se consagrava com O império contra-ataca. Hoje, os enfants terribles do cinema americano são os irmãos Wachovski, adeptos de uma estética bem mais alucinante. Mas bastou o trailer do novo Indiana Jones ser colocado no ar para, em cinco dias, ser visto por mais de dois milhões de internautas (o equivalente a 278 acessos por minuto). A julgar por esse número, o velho Indiana Jones ainda tem fôlego para muitas aventuras.

“SOU IMPREGNADO DE INDIANA JONES”

ISTOÉ – Qual é a sua lembrança do primeiro convite para interpretar Indiana Jones?
Harrison Ford – Tom Selleck fora convidado, mas não pôde aceitar porque estava comprometido com uma série televisiva. Recebi então um telefonema de George Lucas me pedindo para ler o roteiro e depois encontrar Steven Spielberg em sua casa. Eu não o conhecia, mas estava muito entusiasmado com a história. O encontro foi ótimo. Deu no que deu.

ISTOÉ – É verdade que o personagem iria se chamar Indiana Smith?
Ford – Não tenho idéia de onde George o tirou. O que sei é que Indiana era o nome do cachorro que ele tinha.

ISTOÉ – Como deu tanta personalidade ao personagem?
Ford – Quando se lê que ele anda com um chicote, usa um chapéu de feltro e não tira a jaqueta de couro na selva, percebe-se que ele é uma pessoa particular. É só vestir suas roupas para logo compreender quem ele é. E, então, saber o que o ator tem de fazer.

ISTOÉ – Então foi só colocar de novo o chapéu para ele retornar?
Ford – Sim. Tive uma longa experiência como Indiana Jones e não me surpreende que eu esteja impregnado dele.

ISTOÉ – Por que o público se identifica tanto com Indiana Jones?
Ford – Porque ele vive aventuras imprevisíveis. O que mais atrai, no entanto, é a alegria e o prazer proporcionados por uma história bem contada.

ISTOÉ – O que impressiona em Spielberg?
Ford – A sua fluência e talento cinematográficos. Tem apurado senso de como o cinema funciona e ama todo esse processo, o que dá prazer de trabalhar ao seu lado.

ISTOÉ – Acreditava que seria possível retomar a série depois de 19 anos?
Ford – Eu imaginava que isso iria acontecer um dia. Cinco ou seis anos depois do terceiro episódio, começamos a conversar sobre essa possibilidade.

ISTOÉ – Foram escritos muitos roteiros?
Ford – Algumas versões da história não foram na direção certa, mas eu sabia que iríamos achar o tom.

ISTOÉ – Harrison Ford, 19 anos mais velho, agora com 65 anos de idade. Isso é mostrado com humor no filme?
Ford – Indiana está tão bem conservado como eu.

ISTOÉ – Muitos atores evitam as continuações. Não é o seu caso.
Ford – O show business tem sido generoso comigo.

"Indiana é uma pessoa particular. É só vestir as suas roupas para logo se compreender quem ele é" Harrison Ford, ator

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