segunda-feira, 19 de novembro de 2007

...e o vento voltou...

O livro... e o vento levou ganha uma continuação escrita por fazendeiro americano que detesta o original

NATÁLIA RANGEL

Está de volta ...E o vento levou, um dos mais famosos romances da literatura americana. Não se trata de uma reedição do livro clássico, escrito em 1936 por Margaret Mitchell, mas de sua continuação. Chama-se Rhett Butler's people (Editora St. Martin, 400 págs., ainda sem título em português) e seu autor é o ex-publicitário e hoje criador de ovelhas na Virginia Donald McCaig. A história original se passa durante a guerra civil americana e centra-se na relação amorosa entre uma filha de fazendeiros (Scarlett O'Hara) e um arrivista aventureiro (Rhett Butler) - mantendo-a sempre no primeiro plano. Com seus ingredientes épicos e melodramáticos, a obra foi levada ao cinema em 1939 e ganhou dez Oscar, entre eles o de melhor atriz (Vivien Leigh). Rhett Butler é vivido por Clark Gable.

Se no primeiro livro pouco se sabe sobre as origens de Butler, no novo a sua vida é mostrada em detalhes. Rhett Butler's people privilegia esse personagem e constrói a trama do ponto de vista dele. O leitor vai ficar sabendo que Butler cresceu numa plantação de arroz e tinha um pai muito violento, razão de sua fuga de casa. A amizade entre Butler e a prostituta Belle Watling, por sua vez, começou muito antes do encontro dele com Scarlett e continua no novo romance. A história original termina com Butler e Scarlett separados - ela lhe diz que vai morrer de amor e ele responde, numa antológica frase da literatura: "Querida, não estou nem aí." O livro-continuação os reaproxima, mostrando uma Scarlett bem menos impetuosa e determinada e um Butler sem mistérios e sem cinismo - é quase um pai de família padrão.

APOSTA A editora pagou US$ 4,5 milhões pelo direito de publicação

Com edição brasileira prevista para o início do ano que vem pela editora Rocco, o novo livro promete ser um negócio de milhões. Pelo menos essa parece ser a aposta da editora St. Martin, que pagou US$ 4,5 milhões adiantados para a família de Margaret Mitchell pelos direitos autorais, e colocou nas livrarias dos EUA uma tiragem de cerca de um milhão de cópias. A escolha de quem escreveria a continuação foi uma saga à parte que durou 12 anos: antes de McCaig, outros dois escritores foram contratados e logo demitidos: a escritora inglesa Emma Tennant chegou a terminar o romance (575 páginas), mas ele foi recusado. Na avaliação dos editores, a obra tinha uma sensibilidade muito britânica e poderia não satisfazer o gosto americano. No contrato, constava a exigência de não incluir na obra referências a incesto, miscigenação ou relações homossexuais.

Outro escritor, dessa vez americano, foi vetado antes mesmo de assinar o contrato. Pat Conroy, autor de O príncipe das marés, caiu em desgraça porque numa entrevista ironizou a suposta independência que teria no projeto, declarando que começaria o livro com a seguinte frase: "Depois de fazer amor, Rhett olhou para Ashley Wilkes e disse: 'Ashley, eu já lhe contei que minha avó era negra?'". Além da referência à raça negra, ficava mais que claro que retratava uma relação homossexual, já que, assim como Rhett, Ashley também é homem - o homem, aliás, por quem Scarlett acredita ser apaixonada. McCaig é então convidado a assumir a tarefa porque um dos representantes editoriais da família Mitchell leu o seu livro sobre a guerra civil americana e gostou. Escolhido, ele gastou seis anos só em pesquisas. McCaig conta que jamais lera o romance. "Eu caí de pára-quedas nessa história toda. Nunca tinha lido ...E o vento levou nem visto o filme. O livro da senhora Mitchell era para mim uma novela, e não um fenômeno", disse McCaig em entrevista à ISTOÉ.

"Scarlett O'Hara é a melhor personagem feminina da literatura americana. E a narrativa do livro, ainda que floreada, atrai o leitor para a história"

DONALD MCCAIG, autor de Rhett Butler's people

O autor escreveu o romance em sua fazenda de carneiros: "Trabalhei, provavelmente, uns 300 dias por ano." A narrativa se passa entre os anos de 1843 e 1874. McCaig gostou de dar vida nova aos tipos criados por Margaret: "Scarlett O'Hara é a melhor personagem feminina da literatura americana. E a narrativa do livro, ainda que floreada, atrai o leitor para a história." Mas é implacável com as mil e poucas páginas do romance original: "É muito longo e o enredo é, muitas vezes, inverossímil e enfadonho." Consigo é generoso: "Escrevi um bom livro. Não conheço muitos autores que pudessem ter feito isso dar certo."

CLÁSSICO No filme baseado no livro original, Clark Gable e Vivien Leigh imortalizaram Butler e Scarlett. Na nova obra, que também deverá ir para as telas, ela é menos impetuosa e ele, menos cínico

Fonte: Revista Isto é - www.istoe.com.br - Acesso em: 19/11/07

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