segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Filmes com temática homossexual usam abordagens diferentes sobre o assunto


Uma série de filmes com temática homossexual tem causado a impressão de que o cinema brasileiro finalmente parece ter acordado para as possibilidades dramáticas do tema. A saída do armário do cinema brasileiro não é recente. Mas títulos como Elvis e Madona, de Marcelo Laffite, um dos que disputaram o Festival do Rio 2010, têm trabalhado a questão de uma forma bem diferente do que acontecia em décadas anteriores.

Nele, uma lésbica, Simone Spoladore, se apaixona e engravida de um travesti (Igor Cotrim). Longe de encarar a situação como um drama, a história ganhou contornos de chanchada carioca nas ruas de Copacabana.

— Os personagens são gays, mas não acho que o filme seja. Em primeiro lugar, é preciso considerar que é uma fábula, um pouquinho descolada da realidade. A cada 10 pessoas que assistem, sete adoram, uma não liga e duas odeiam — contabiliza Laffite.

Inclusive, o cineasta já considera a possibilidade de reeditar o trailer de lançamento do filme por considerar que ainda não representa a leveza com que o tema é abordado.

A homoafetividade é justamente uma das lacunas que o filme Como esquecer, de Malu de Moraes, tenta preencher. Na pele da professora universitária lésbica Júlia, a atriz Ana Paula Arósio sofre como o diabo para esquecer a ex-companheira Antônia. Enquanto o amigo, também homossexual e viúvo, Hugo (Murilo Rosa) tenta resgatá-la do fundo do poço levando-a para morar no subúrbio do Rio de Janeiro. Inspirado no livro Como esquecer: anotações quase inglesas, de Myriam Campello, o filme nem sequer considera o conflito de sexualidade.

— Os personagens já têm mais de 30 anos, supõe-se que já tenham essa questão bem resolvida — explica a diretora.

O esforço maior da produção concentrou-se em apresentar os sentimentos de pessoas que lidam com a perda, de maneiras diferentes.

— Acho que a Júlia é mais o estereótipo de uma mulher intelectual do que homossexual. A maneira de lidar com as perdas é que é a questão. Tentamos apresentar dramas humanos sem o uso de personagens caricatos, histriônicos. A gente fala sobre relacionamentos — sintetiza Malu.

Ano passado, o filme Do começo ao fim, de Aluizio Abranches, gerou polêmica. Menos por retratar a homossexualidade e mais porque o terceiro longa do diretor concentra o romance dos protagonistas entre dois irmãos.

Após uma bateria de entrevistas com produtores, atores e personalidades cinematográficas, a impressão da jornalista e apresentadora do Canal Brasil Simone Zucolloto é de que as mudanças ainda são tímidas.

— A maior conclusão é que o cinema brasileiro até hoje não aborda o homossexual da mesma maneira que aborda o heterossexual. Em geral, o viés dramático é sempre baseado na sexualidade — resume Simone.

Para o professor da escola de comunicação social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denílson Lopes, os novos filmes brasileiros que tratam do tema da homossexualidade tentam, de alguma forma, iniciar um diálogo com plateias cada vez maiores.

— Os filmes são acessíveis e não têm nada de experimentais. Não se vinculam ao cinema novo, marginal ou à videoarte. São filmes que almejam um público mais amplo — acredita o pesquisador.

Porém uma outra espécie de exclusão pode estar acontecendo nas telas.

— Há toda uma construção de quase um novo herói romântico. O gay ultraeducado que é o melhor amigo da amiga heterossexual. Nenhuma pessoa é assim o tempo todo. Todo mundo tem zonas cinzas. Essa inversão da imagem negativa para positiva tem sido feita de um jeito muito simplificado. É preciso se lembrar que a figura do herói pode ser tão simplista quanto a do vilão — critica Lopes.


CORREIO BRAZILIENSE

Nenhum comentário: