segunda-feira, 12 de maio de 2008

Cinema em dose dupla

Fonte: Revista Isto é - Acesso em: 12/05/08

Fernando Meirelles e Walter Salles vão a Cannes, concorrem entre si e ampliam as chances de o País ganhar a Palma de Ouro

IVAN CLÁUDIO

Meirelles leva o seu globalizado Ensaio sobre a cegueira
Salles concorre com Linha de passe, tema bem brasileiro

Na disputa pelo Oscar de melhor filme estrangeiro, Central do Brasil, de Walter Salles, teve como pedra no caminho A vida é bela, do italiano Roberto Benigni. Mais recentemente, a torcida pela consagração de uma produção nacional na maior premiação do cinema aumentou com Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, que concorreu a quatro estatuetas, entre elas a de melhor diretor. Ele perdeu para o neozelandês Peter Jackson. Na próxima edição do Festival de Cannes, que começa na quarta-feira 14, Salles e Meirelles, os dois mais bem-sucedidos cineastas brasileiros, desta vez estarão concorrendo entre si pela Palma de Ouro - o primeiro com o drama social Linha de passe, que custou pouco e reúne atores jovens e desconhecidos, o segundo com o caro e globalizado Ensaio sobre a cegueira (escolhido para abrir o evento), inteiramente falado em inglês e estrelado por grandes nomes de Hollywood, como Julianne Moore e Mark Ruffalo. Na verdade, poderia estar ocorrendo o contrário, já que Salles assina freqüentemente produções internacionais e Meirelles costuma se dedicar a projetos voltados a temas brasileiros. Como acontece poucas vezes em festivais, o Brasil joga agora em duas frentes, oferecendo um filme com cara de independente e outro com perfil de cinema de arte. Para qualquer lado que pender o gosto do júri, presidido por Sean Penn, as chances serão, no entanto, exatamente as mesmas, sobretudo no que diz respeito a sua influência: ele já declarou que aprecia tanto o trabalho de Walter Salles quanto o de Fernando Meirelles.

BEM NA ESTRÉIA
O ator Matheus Nachtergaele já trabalhou com Salles e Meirelles e segue agora o passo dos dois mestres. Seu primeiro trabalho, A festa da menina morta (à esq.), está na mostra paralela de Cannes

Dentre a obra de Meirelles, o presidente do júri gosta especialmente de Cidade de Deus. Além dessa empatia, ele conhece bem a trama de Ensaio sobre a cegueira, baseado na obra homônima de um dos maiores nomes da literatura portuguesa, o escritor português José Saramago. Trata- se de uma metáfora sobre a resistência humana em enxergar a realidade e teve muitas cenas rodadas em São Paulo. Há, aqui, uma curiosidade que o Brasil leva a Cannes no campo das locações: os dois filmes fogem da tendência atual de só se exibir o Rio de Janeiro e a sua violência urbana e se valem de regiões e ruas paulistanas como cenários. Linha de passe, co-dirigido por Daniela Thomas, é centrado, por exemplo, numa família pobre da zona leste da cidade. Um de seus personagens, Dario, é interpretado por Vinícius de Oliveira, justamente o então menino de Central do Brasil. Como já foi dito, nem com esse filme nem com Cidade de Deus o Brasil carregou o Oscar. Agora, concorrendo em dose dupla, tem muitas chances de levar a Palma.

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